Pouco a pouco, os heróicos participantes recolheram às tendas e foram-se preparando para o concurso nocturno, afinavam trombetas, ensaiavam gritos de guerra. Durante a noite o espectáculo foi sublime. Para entrada, música africana em triplo stereo, gritada por uns aparelhos sonoros de marca conceituada no mercado, todos afinadinhos na mesma estação de rádio e que se ouviu por todas as aldeias num raio de 50 km. O concerto acabou em êxtase com o remate do Maestro D’Oliveira que tirou as chaves das ditas e só as devolveu no dia seguinte à força de ameaças violentas. Depois do aperitivo musical deu-se início ao tão esperado concurso.
Do lado direito do acampamento, o batalhão do Norte (
comandado pelo Maestro d’Oliveira e pelo V. Soares) fazia jus às vendedoras do Bulhão, com inspirações sonoras e intermitentes e estrondosos roncos. A meio, os manos grandes não deixavam os créditos por mãos alheias e ora roncavam em uníssono, ora roncavam intervalados, numa sinfonia digna de uma salva de canhões. Mas o ponto alto do concerto vinha do outro lado, um ex-combatente que disparava em todas as direcções, grandiosos roncos estridentes que fizeram o Baltazar sair do banho nocturno a pensar que afinal os peixes eram perigosos. Depois de medidos os decibéis, decidiram acordar o autor e oferecer-lhe umas bifanas para o Calar. Mas o homem não se deu por vencido e depois de voltar a adormecer recuperou a embalagem e acelerou toda a noite para afirmar a sua posição vencedora.
Embalados pela orquestra ruidosa, lá enfrentámos a noite, a fingir que dormíamos até que o amanhecer nos presenteou com um dilúvio matinal. Debaixo de uma chuva persistente, conseguiu-se tomar o pequeno-almoço, todos ensonados e remelados, de volta do pão, queijo, fiambre, sumos, bifanas e cascas de sardinhas.
Quando finalmente abrimos os olhos para a vida notou-se um certo sossego estranho. Que se passa, falta alguém, onde está o Adolfo Costa? Os resultados da investigação judicial apontavam para uma deserção nocturna, facto testemunhado por um aflito que tinha ido à moto buscar um jogo adicional de tampões de ouvidos e que viu o sócio AC a pirar-se de fininho e a resmungar que não conseguia dormir e que com o barulho dos grilos nem conseguia roncar em condições. Foi condenado sumariamente e a sentença executada com brilhantismo (
Baltazar e Bip Bip eu não vou dizer quem foi, ok?) – rapidamente a tenda do malvado desceu a margem, atravessou o rio e pousou em cima dos nenúfares e por lá ficou a meter água devagarinho. Felizmente a execução foi à porta fechada, a fila de mirones estava a olhar para a beleza do rio e nem existem milhares de fotos a comprovar o sucedido.
E a manhã foi passada debaixo dos toldos que o RB descobriu dentro da carrinha humanitária, em conversas e apostas que a chuva vai acabar, está a abrir lá ao longe, molhados mas satisfeitos. Alguns desistiram e debandaram para o aconchego dos lares mas um grupo de bravos não arredou pé. E o São Pedro foi solidário a acabou com a chuva.
os bravos solidários desmontaram as tendas ensopadas, conseguiram o milagre de as arrumar nas malas das motos e ainda arrumaram o acampamento, limparam o chão, desmontaram o sistema eléctrico que afinal nunca funcionou e lavaram tudo à mangueirada pois em época de falta de água as moscas invadem tudo. Mais um desafio de encaixar tudo de novo no carro de apoio, com a preciosa colaboração dos manos grandes que pegaram na máquina da cerveja como se fosse um brinquedo de crianças. Quando chegou a vez dos barris fizeram greve. Então e não há mais concursos?
Era o que o pessoal queria ouvir. Rapidamente se formou um túnel se assistentes ao lançamento do barril, com palmas e hurras a quem conseguia ultrapassar o limite do anterior, vários concorrentes que foram abafados pelo despique entre os manos gigantes e até houve quem tentasse técnicas inovadoras de levar o barril até à meta, a correr e a tropeçar com o barril às costas. Uma festa de força, de apostas e de risos.
Estava na hora de alimentar os bravos do pelotão. Foi anunciada a existência de um afamado restaurante da zona, com pratos típicos, morcelas e queijos regionais, arroz de ervilhas, salada e febras na brasa. Abandonámos o local do acampamento já com saudades da festa e subimos a Serra para mais uma prova de resistência. Para chegar ao restaurante era necessário apanhar um trenó para ultrapassar uma descida arriscada, valeram os equipamentos de protecção para evitar traseiros arranhados. Os progenitores do AC receberam-nos com a simpatia usual, a mesa estava posta, devorámos o almoço e os digestivos de produção caseira e alguns dormiram uma sesta. Hora de regressar, voltar à estrada e descansar deste evento mal organizado mas que voltou a ser uma prova que as amizades dentro da Comunidade são únicas e preciosas.
Obrigada ao Tozé Costa e ao Rui Baltazar pela ideia, pelo trabalho, pela disponibilidade. Obrigada a todos pelo excelente convívio. Mais uma iniciativa para entrar no calendário oficial da Comunidade CKLT.